quinta-feira, 11 de agosto de 2016

Elizeth Cardoso


Elizeth Cardoso

Vida
A cantora Elizeth Cardoso, cujo nome completo era Elizeth Moreira Cardoso e que recebeu de um crítico o apelido de A Divina nasceu no dia 16 de julho de 1920 no Rio de Janeiro. Era filha de Dona Moreninha, uma morena baiana que adorava cantar e de Jaime Moreira um mulato de 1m 90, fiscal da prefeitura, violonista amador e seresteiro nas horas vagas. Viveu a infância entre Méier e Engenho de Dentro mas a família acabou fixando residência por um bom tempo na Praça Onze, berço do samba.
Neste ambiente, não seria difícil que a pequena Elizeth com apenas seis anos em abril de 1926 já estreasse como cantora o que se deu no palco da famosa Kananga do Japão uma das muitas sociedades dedicadas a dança e ao carnaval instalada na Praça Onze e seus arredores.
Dali Elizeth mudou-se para Jacarepaguá onde brincava de entoar cantigas de roda e apreciava todo tipo de músicas domésticas com os parentes e a vizinhança. Elizeth ainda na adolescência adorava as canções do repertório do cantor Vicente Celestino soltando a voz muito comportada num cirquinho improvisado nos arredores de sua casa.
Aos dez anos de idade Elizeth teve que sair da escola quando ainda cursava o terceiro ano primário para trabalhar se aventurando em todo tipo de emprego. Começou numa charutaria, passou a uma bomboniere, á Oficina de Peleteria Francesa ao cargo de telefonista nas Caixas Registradoras Nacional, à prensa e a seção de embalagens da fábrica de sapóleos Rex e finalmente no Salão Catumbi onde sua especialidade era esticar cabelo com aplicação de brilhantina da marca Parisiense. Seria também pedicure no mesmo salão.
Elizeth , como já foi visto teve uma origem muito humilde como suas colegas de profissão Dalva de Oliveira, Ângela Maria, Carmem Costa, Dolores Duran ou Emilinha Borba mas ao contrário delas foi a que mais demorou a atingir o sucesso via rádio, TV e disco.
E ela começou imitando o registro de três cantoras de registros completamente diferente: Araci de Almeida, Odete Amaral e Marília Batista. No início, segundo a cantora, vale tudo.
Já morando numa casa de cômodos na Rua do Resende conheceu o exigente Jacob do Bandolim. Ela tinha dezesseis anos. Ele dezoito anos. Após ouvi-la cantar o compositor pensou em levá-la para a Radio Clube do Brasil. Mas surgiu um problema. Em princípio a família e principalmente o pai não apoiou sua ideia de ser artista porque segundo o pai o meio artístico não era lugar para moças de boa família. Mas já em novo endereço passou a frequentar a cada do bandolinista que a usava como intérprete das músicas que ele fazia sozinho ou em parceria com Luiz Bittencourt.
Rompendo por fim o bloqueio paterno em 18 de agosto de 1936 Elizeth começou cantando no Programa Suburbano um dos principais da Radio Guanabara. Passou a fazer aparições esporádicas em vários programas das Rádios Transmissora e Marynk Veiga mas a verdade é que não podia ser uma cantora do rádio mas por sua beleza, elegância e animação aos 17 anos já foi musa num desfile de carnaval no bloco Turunas de Monte Alegre.

Amores, Escolhas e Sucesso

Durante uma excursão com uma companhia teatral em Belo Horizonte conheceu e começou a namorar Ari Valdez, o Tatuzinho, comediante e tocador de cavaquinho. Seguiram para Belém quando decidiram se casar. Mas o comediante traiu a parceira de todas a maneiras tanto que após algum tempo ela exigiu a separação.
Elizeth foi então, já grávida trabalhar no famoso Dancing Avenida no qual cada dançarina possuía um cartão que era marcado conforme o tempo que dançava com cada cavalheiro. Depois de uma breve e infeliz carreira de táxi girl já com um filho a tiracolo passou a crooner no mesmo Dancing.
A cantora já começava a conquistar uma legião de admiradores e não tardou em cantar em diversos outros dancings de então no Rio e até em São Paulo.
Passaram-se dez anos quando em 1948 durante uma temporada no Dancing Belas Artes conheceu o compositor, radialista e jornalista Evaldo Ruy, que além de ter tido um caso com ela atuou como um verdadeiro padrinho musical orientando-a na postura de palco a mexer direito os braços e levou-a a Rádio Mauá. Ele teve sucesso. Em breve a cantora já era levada de volta aos microfones da emissora onde deu os primeiros agudos a Rádio Guanabara que a contratou por dois anos.
Finalmente aos trinta anos de idade por intermédio de Ataulfo Alves conseguiu gravar seu primeiro disco de 78 rotações na recém- criada gravadora Star. Mas não foi desta vez que começou sua carreira com sucesso pois o disco foi recolhido por problemas técnicos. Pouco depois o compositor, cantor e divulgador Erasmo Silva ouviu-a cantando no Dancing Avenida e achou-a uma excelente candidata a figurar no elenco da Todamérica que já atuava como editora musical mas ia abrir um selo.
Ganhou um belo samba-canção de dois colegas da Rádio Guanabara, Chocolate e o operador técnico Elano de Paula irmão do famoso comediante Chico Anísio. Era Canção do Amor

Canção do Amor

Saudade torrente de paixão
Emoção diferente
Que aniquila a vida da gente
Uma dor que não sei de onde vem
Deixaste meu coração vazio
Deixaste a saudade
Ao desprezares aquela amizade
Que nasceu ao chamar-te meu bem
Nas cinzas do meu sonho
Um hino então componho
Sofrendo a desilusão
Que me invade
Canção de amor, saudade!
Saudade

Embora chegando as lojas perto do carnaval bastou que esta canção romântica fosse tocada algumas vezes para que fosse notada por ninguém menos que a maior patente do Rádio, Almirante que a convidou para integrar o cast da Rádio Tupi. Elizeth custou a acreditar que estava recebendo chance tão grande !
Em 1953, foi convidada para atuar na boate Casablanca no espetáculo Feitiço da Vila sobre a obra de Noel Rosa. Pois dali a pouco viajou com o elenco para a prestigiadíssima boate Esplanada em São Paulo, chamando a atenção da cadeia de Rádio e TV Record. Na era pré- videoteipe alternava um emprego fixo em São Paulo e no Rio- na Rádio e na TV Tupi. E graças a um acordo com a Todamerica começou a gravar na Continental músicas melhores como “Ocultei” de Ary Barroso.
Em 1954 tomava parte no elenco da boate Vogue a mais prestigiada do Rio de Janeiro assinando nesta época com a TV Rio depois excursionou ao Uruguai e atuou com Sílvio Caldas em outra boate frequentada pelos grãos finos paulistas a Oásis. Seguiram-se contratos cada vez melhores como um de dois anos com a Rádio Mayrink Veiga estreando após a folia carnavalesca de 1955. Depois tem o primeiro LP de dez polegadas com oito músicas lançado pela Continental: Canções a meia luz.
O Apelido

Quando seu contrato com a Todamerica acabou em 1956 a cantora foi contratada pela Copacabana Discos e passou a uma escala ascendente de sucessos. Nesta época já era apontada pela popularíssima Revista do Rádio com uma das dez cantoras mais elegantes do país. A partir dai atuou em inúmeras boates e não se pode medir o número de espetáculos que fez.
Numa das temporadas na boate Oásis nasceu o famoso título de Divina dado por Haroldo Costa jornalista e produtor de shows. Numa coluna que ele escreveu substituindo seu amigo Sérgio Porto decidiu falar no tal show na boate paulista inventando que um grupo portava uma faixa que dizia Elizeth A Divina. Curiosamente tal inspiração veio de um amigo que adorava a atriz Greta Garbo e ó se referia esta famosa atriz sueca com este adjetivo.

Casos Amorosos e Relações com Outros Artistas

Muito discreta na vida pessoal sabe-se que Elizeth teve relacionamento amoroso com muito de seus admiradores. Aliás, ela era sempre escalada para receber as personalidades artísticas estrangeiras. Foi assim com Louis Armstrong, Brooker Pitman, Nat King Cole e Sara Vaughan com quem cantou na ocasião e manteve longa amizade apesar de não falar inglês.

Barracão
Em 1968 a cantora participaria de um show antológico e memorável feito em prol do Museu de Imagem e Som junto com o compositor Jacob do Bandolim o conjunto Época de Ouro e o Zimbo Trio. No show houve a união entre tradição e modernidade da música brasileira, alternado músicas da antiga com outras mais modernas. Entre tantos sucessos de várias épocas da música brasileira o show consagrou o samba “Barracão” cantado maravilhosamente pela Divina.

Barracão ( Luiz Antonio – Oldemar Magalhães)

Ai barracão
Pendurado no morro
E pedindo socorro
A cidade a seus pés
Ai barracão
Tua voz eu escuto
Não te esqueço um minuto
Porque sei
Que tu és
Barracão de zinco
Tradição de meu país
Barracão de zinco
Pobretão Infeliz
Ai barracão
Pendurado no morro
E pedindo socorro
Ai a cidade
A seus pés
Barracão de zinco
Barracão de zinco


Elizeth também foi uma cantora popular que ousou gravar as Bachianas Brasileiras n 5 do compositor erudito Heitor Villa- Lobos.
Elizeth recebeu elogios de Edith Piaf e fez sua primeira viagem ao Japão onde cantou em Tóquio para um público de 4.500 pessoas.
Sofreu muito com a perda do último companheiro e viajou novamente para o Japão. Durante a viagem com uma turnê por quinze cidades do Japão teve seu primeiro susto passou muito mal e chegou a ser hospitalizada. Na volta foi diagnosticado um câncer da qual foi operada sem saber. Ainda fez algumas apresentações, mas voltou a mesa de operações. O último disco que ela teve ainda a chance de ver finalizado foi Ary Amoroso lançado em dezembro de 1989 pouco antes de falecer do dia 7 de maio de 1990 a dois meses de completar 70 anos.

Canção da Manhã Feliz ( Haroldo Barbosa- Luiz Reis)

Luminosa Manhã
Tanto céu, tanta luz
Dá-me um pouco céu
Mas não tanto azul!
Dá-me um pouco de festa, não esta
Que é demais pros meus anseios
Você sabe, manhã, ele veio!
Despertou-me sorrindo
E até me beijou...
Eu abri a janela
E este sol entrou
De repente em minha vida
Já tão fria e sem desejos
Estes festejos, esta emoção
Luminosa manhã!
Tanto céu tanto azul
È demais
Para o meu coração!

quarta-feira, 10 de agosto de 2016

Assis Valente


Assis Valente

Vida

José de Assis Valente nasceu em 19 de março de 1911. Tudo é obscuro a respeito de informações sobre o início de sua vida a começar pelo local de nascimento. Seria o Campo da Pólvora em Salvador. Outros biógrafos porém, apontam o município de Santo Amaro da Purificação. A certidão de casamento passada no Rio em 1939 aponta Pateoba como berço. Sobre os pais parece não haver dúvidas: era filho de Maria Esteves Valente, negra e José de Assis Valente descendente de portugueses que lhe passou o nome na íntegra.
Morou em Alagoinhas com a família que o sufocava com tarefas pesadas para um menino como a de carregar sob o sol e a longa distância a farta feira semanal da casa. Desligou-se dos tutores após voltar com eles para Salvador.
Assis Valente estudou desenho e escultura no Liceu de Artes e Ofícios e fez um curso de prótese dentária, especialidade na qual acabou como sinônimo de excelência. O desenhista chegou a ganhar prêmio significativo recebido das mãos do governador da Bahia J.J. Seabra, certamente no segundo mandato de 1920 a 1924 deste político que já havia governado o estado de 1912 a 1916. Costumam atribuir muitas atividades a Assis Valente nesse período. Além de trabalhar no circo, também dedicou-se ao estudo da arte e do aperfeiçoamento como protético.
Veio para o Rio em 1927. Publicou desenhos nas prestigiosas revistas Fon-Fon e o Cruzeiro e na atrevida Shimmy, nesta como colaborador regular. Impôs- se como protético atividade na qual consolidou reputação única.
Boas Festas

Assis Valente compôs Boas Festas em um Natal em que passou completamente solitário. Num cubículo de casa modesta em Niterói reparou na gravura de artista anônimo colada à parede na qual uma menina esperava o presente de Papai Noel com os sapatinhos sobre a cama. A canção foi gravada por Carlos Galhardo em outubro de 1933 com a Orquestra Diabos do Céu arranjo e regência de Pixinguinha.

A letra é a seguinte:

Anoiteceu
O sino gemeu
A gente ficou
Feliz a rezar
Papai Noel
Vê se você tem
A felicidade
Pra você me dar
Eu pensei que todo mundo
Fosse filho de Papai Noel
Bem assim felicidade
Eu pensei que fosse uma
Brincadeira de papel
Já faz tempo que pedi
Mas o meu Papai Noel não vem
Com certeza já morreu
Ou então felicidade
É brinquedo que não tem.

Não há nesta canção nenhum pieguismo ou ingenuidade mas sim perfeita assimilação da filosofia popular. E uma postura oficial transformou a música em hino oficial do Natal carioca. Melhor a musica se tornou o hino informal do Natal brasileiro.
Carmem Miranda

O segredo da realização de Assis Valente como compositor terá sido conquistar como intérprete Carmem Miranda que o encantava também como mulher
Foi a grande cantora que estreou a marchinha carnavalesca “Good Bye” vencedora do concurso de marchinhas carnavalescas, sátira ao brasileiro que copia e imita o estilo de vida e os modismos do inglês e do norte-americano mal conhecendo a própria cultura.

Good bye
Good bye boy
Deixa a mania do inglês
È feio para você
Moreno frajola
Que nunca frequentou
As aulas de escola

Good bye
Good bye boy
Antes que a vida se vá
Ensinaremos cantando
BE-be Bi bi Ba ba

Não é mais boa noite
Nem bom dia
Só se fala good morning e good night

Já desprezou o lampião de querosene

Lá no morro só se usa luz da Light.

O compositor já tinha apelado para este tipo de sátira com “Tem francesa no morro” sátira a estrangeirismos e modismos na linha aberta por Lamartine Babo com “Canção para inglês ver” e engrandecida por Noel Rosa com “Não tem tradução”
“Senti que tinha surgido” - declarou o compositor no show em que Carmem Miranda cantou Good Bye pela primeira vez em público. Foi um sucesso tão grande que arrancou lágrimas dos olhos do compositor. Carmem o viu e gritou para o povo “ Vou apresentar a vocês o dono da música”. Houve bis todos cantaram em coro. A outro compositor Assis contou como surgiu a composição: “Encontrei motivo quando fui a uma festa em Vila Isabel onde as expressões em inglês eram usadas sem senso de ridículo Declamava-se muito Olegário Mariano muito Menotti del Picchia as senhoras em soirées e os almofadinhas trocavam muitos bye-byes. Achei aquilo tudo engraçado e senti pena. Na volta para casa tinha uma marchinha esboçada.

Morte

A morte de Assis Valente foi suicídio. Matou-se na Praia do Russel adicionando formicida a um copo de guaraná.
As causas para tal atitude ainda não foram explicadas. Antes, em 1941, já tentara o suicídio.
Nesta época cantava-se por toda parte "Recenseamento" uma de suas melhores músicas que aproveitava um episódio da rotina político-administrativa para fixar novos flagrantes dos costumes dos morros a fazer deliciosas ironias com o ufanismo oficial.
Tentara o suicídio atirando-se do Corcovado. Tentativa infrutífera saltara para o lado da Gávea onde a inclinação é menos íngreme e há muitas árvores. O corpo enganchara-se na copa das árvores uns 70 metros abaixo. Em sua queda no espaço o corpo havia misteriosamente se embaraçado no cipoal e queda aparada, ficara enganchado numa árvore mais frondosa.
Os trabalhos de salvamento levaram horas. Tarde da noite no Pronto Socorro constatou-se que Assis tinha sido o primeiro homem a se atirar do Corcovado e não morrer. No hospital confortado pela mulher Nadyle e pelos amigos muito dos quais também compositores de música popular foi interpelado pelo compositor Ary Barroso que o censurou fortemente por ter tido aquela atitude. Sua resposta levantou uma ponta do enigma: “ Glórias não resgatam letras.
A tentativa no Corcovado teve muito mais repercussão do que o suicídio na Praia do Russel- e isso nada tem a ver com sítios turísticos. Isso porque foi a atitude de um homem que não interessava mais como artista a uma indústria musical que estava tomando outros caminhos.

Sinhô


Sinhô (José Barbosa da Silva)

Vida

José Barbosa da Silva, o Sinhô, autodenominado Rei do Samba, nasceu no Rio de Janeiro no dia 8 de setembro de 1888. Seu pai, Ernesto Barbosa da Silva, o Tené, era pintor. Tené acabou por se casar com a portuguesa Graciliana. Tiveram dois filhos, o mais velho. José, o Sinhô e o caçula, também Ernesto, o Caboclo.
O que se pode deduzir é que mesmo vindo do Estado do Rio, Ernesto não era tão pobre quanto os ex-escravos do vale do Paraíba. Pelo contrário, era pessoa já estabelecida com ofício, casa, comida, tempo para lazer e apreciador das artes com gosto pela música e vontade de que o filho viesse a ser flautista de um dos grupos de choro de sua admiração. Não fosse assim e Sinhô não teria o piano dos avós para descobrir seu verdadeiro instrumento que aprendeu rapidamente. Abandonou a flauta para se dedicar ao piano e, menos, ao violão e ao cavaquinho.
José livrou-se cedo da educação rigorosa que o pai lhe impusera. Não aprendeu flauta e não quis trabalhar como auxiliar de pintor. Aos 17 anos já estava vivendo com a portuguesa Henriqueta Ferreira, um ano mais nova, com quem foi morar no subúrbio de São Francisco Xavier. Tiveram três filhos, um homem e duas mulheres. Mudaram-se várias vezes, ( Engenho de Dentro, Morro do Castelo, Catumbi) e viveram quase sempre em extrema pobreza. Até que Henriqueta morreu, aos 25 anos, em 1914.
Pouco se sabe dos noves anos em comum que o compositor viveu com Henriqueta .O certo é que passaram por privações, dificuldades financeiras e mudanças. Consta que no entanto que em 1911 ele foi um dos fundadores e pianista do rancho Ameno Resedá, pelo qual saia no Carnaval. E tudo indica que o dinheiro, pouco, era ganho tocando piano em festas familiares e pequenos clubes do bairro. Ou, já depois da morte da mulher, em grêmios dançantes e carnavalescos em que se tornaria conhecido . Um deles, O Tome Abença a Vovó. Outro os Netinhos do Vovô. Outro mais, o Kananga do Japão, no número 44 do Senador Eusébio na Cidade Nova.
Sinhô tinha com o Kananga antiga relação sentimental o pai era sócio da casa e para ela pintara um dos estandartes.
Um ano depois da morte da mulher, de bolsos vazios ele já se fizera muito conhecido principalmente como pianista, hábil que era na execução de ritmos do momento. Em 1915, os jornais já se referiam a ele como inspirado maestro, inclusive como uma das atrações de recital realizado na sociedade Fidalgos da Cidade Nova, ele no piano e Pixinguinha na flauta. Sinhô era muito requisitado por toda parte. Por conta própria, fazia ponto em casas de música para travar conhecimento com o pessoal do meio e, ao mesmo tempo, aproveitar os pianos para ensaiar ou exibir-se para os clientes. Tinha comissão pela venda de um dos pianos.
A rotina seguida por Sinhô era a seguinte; acordar ao meio-dia, fazer ponto à tarde nas casas de música alternar as noites entre tocar em sociedades dançantes e frequentar reuniões musicais e cultos religiosos na Cidade Nova. Mais tarde ia tocar violão para uma de muitas de suas amantes, geralmente prostitutas.

Mulheres

Além de Henriqueta, Sinhô também conheceu uma mulher chamada Cecília, pianista, musicista formada, alguns anos mais velha que virou sua amante e era a pessoa a quem ele recorria para passar suas composições para a pauta antes de serem editadas. Com ela Sinhô aprendeu, de foma incipiente a ler partituras que tocava para os eventuais interessados em comprá-las. Depois de Cecília ele ainda teria entre incontáveis amantes duas com quem viveria: Carmem prostituta que trabalhava na Avenida Mem de Sá e Nair Moreira, a Francesa companheira de 1922 até sua morte
No enterro do compositor seria registrada uma briga ente Nair e Araci Cortes a maior estrela do teatro de revista da época.

Polêmicas Musicais

Vaidoso e carismático, Sinhô era um gênio da autopromoção. Para alcançar fama não hesitava em provocar outras pessoas em suas músicas. Um de seus alvos foi Pixinguinha, seu irmão Otávio da Rocha Viana e o grupo dos baianos, assim chamados porque eram descendentes dos escravos que vindos da Bahia migraram para o Rio na segunda metade do século XIX e que faziam suas reuniões nas casas das lendárias “tias” baianas cuja pessoa mais famosa foi Hilária Batista de Almeida, A Tia Ciata.
A primeira provocação musical foi com o samba “Quem são eles”

A Bahia é boa terra? Ela lá e eu aqui, iaiá /Ai ai ai/ Não era assim que o meu bem chorava/ Não precisa pedir que eu vou dar/Dinheiro não tenho, mas vou sambar....”

Não ficava claro a quem Sinhô provocava em seus versos, mas certamente era um ou vários baianos
A reação dos atingidos foi imediata. Hilário Jovino de Almeida respondeu com “ Não és tão falado assim”.
Donga, autor de “Pelo Telefone” registrado como primeiro samba da história da música popular brasileira com “ Fica calmo que aparece” e Pixinguinha e seu irmão com o mais explícito “ Já te digo”

Um sou eu/ E o outro eu já sei quem é/ Ele sofreu / Para usar colarinho em pé.”

Num dos versos desta música Sinhô era descrito como alto, magro, feio e desdentado. Na estrofe final o flautista Pixinguinha debocha do ex- flautista José:

No tempo em que tocava flauta/ Que desespero! / Hoje ele anda janota / A custa dos trouxas/ Do Rio de Janeiro”

Não devemos pensar que Sinhô se ofendeu com as respostas a seu samba, tivesse este, ou não, a turma baiana como alvo. Tudo aquilo servia aos seus propósitos que eram oferecer material para suas polêmicas musicais e o de se promover cada vez mais.

Para criticar o irmão de Pixinguinha, que tinha pés grandes, Sinhô fez a seguinte música:



O Pé de Anjo ( Sinhô)

Eu tenho uma tesourinha
Que corta ouro e marfim
Guardo também para cortar
As línguas que falam de mim
Ò pé de anjo, ó pé de anjo
És rezador, és rezador
Tens o pé tão grande
Que és capaz de pisar
Nosso senhor, nosso senhor
A mulher e a galinha
Um e outro interesseiro
A galinha pelo milho
E a mulher pelo dinheiro


A Sátira na obra de Sinhô

As sátiras e críticas de Sinhô não se limitavam ao grupo de baianos, nem a gente modesta da Cidade Nova . Ele chegou a satirizar ninguém menos que Rui Barbosa, o Águia de Haia, um dos maiores intelectuais brasileiros, o gênio da raça, mas que acumulava sucessivos fracassos políticos como a derrota para o marechal Hermes da Fonseca na frustrada campanha presidencial de 1910, conhecida como campanha civilista.

Fala Meu Louro (Sinhô)

A Bahia não dá mais coco
Para botar na tapioca
Pra fazer o bom mingau
Para embrulhar o carioca
Papagaio louro do bico dourado
Tu falavas tanto
Qual a razão que vives calado
Não tenhas medo
Coco de respeito
Quem quer se fazer não pode
Quem é bom já nasce feito


O Maxixe

Costuma denominar-se de maxixe uma forma mais lasciva e requebrada, com forte influência africana de dançar a polca, a habanera, o tango e outras formas de salão de origem europeia. Por isso se afirma que a forma de samba que Sinhô praticava, ou seja, o maxixe acabou, coincidindo com sua morte.
Mas foi com a obra de Sinhô que os brasileiros aprenderam a gostar de samba.
Sinhô morreu no Rio de Janeiro no dia 4 de agosto de 1930.